quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O CONSUMO QUE ASSUSTA


imagem: Gifake

por : Washington Novaes


Não faltam estudos para deixar com os cabelos de pé (os que os têm) quem se preocupa com o futuro da espécie humana neste planeta. Num deles, "Marine Ecology Progress Series", da Universidade do Havaí, Camilo Mora afirma que, com o ritmo atual do consumo de recursos no mundo, chegaremos a 2050 com uma população acima de 9 bilhões de pessoas, que precisará, para abastecê-la, de 27 planetas como a Terra. Quem olhar uma publicação recente da revista National Geographic (maio de 2011) talvez encontre ali reforço para a tese, ao saber qual foi o número de animais mortos em um único ano (2009) para serem transformados em alimentos: 52 bilhões de frangos, 2,6 bilhões de patos, 1,3 bilhão de porcos, 1,1 bilhão de coelhos, 633 milhões de perus, 518 milhões de ovelhas, 398 milhões de cabras, 293 milhões de bois, 24 milhões de búfalos asiáticos e 1,7 milhão de camelos.

Thomas Lovejoy, o respeitadíssimo biólogo norte-americano, acha que já estamos consumindo 50% de recursos além do que o planeta pode repor ( Ideia Sustentável , março de 2011). Outros estudos, inclusive da ONU, falam em "mais de 30%". Estes afirmam que a disponibilidade média de área e recursos para atender às necessidades de uma pessoa estaria em 1,8 hectare; mas o uso tem estado em 2,7 hectares (no Brasil, 2,1; nos Estados Unidos, 10 hectares; no Haiti, menos de um hectare). O uso excessivo leva à aridificação e desertificação de terras, problemas com água, exaustão de certos recursos.

Na conferência de Nagoya, no ano passado, estabeleceu-se como meta chegar a 17% das terras e 10% dos oceanos em áreas protegidas - o que parece pouco provável, já que as metas para 2010, menores, não foram cumpridas, embora haja 100 mil áreas protegidas, com 17 milhões de quilômetros quadrados de terras (o dobro do território brasileiro) e 2 milhões de quilômetros quadrados de áreas oceânicas. Mesmo nessas áreas, entretanto, há desgastes fortes na biodiversidade, por causa de impactos climáticos e contaminação.

Mas o problema não está só na área da biodiversidade. Segundo a publicação BrasilPnuma (junho/julho de 2011), também chegaremos a 2050 consumindo 140 milhões de toneladas anuais de minérios, combustíveis fósseis e biomassa, três vezes mais do que hoje - o que envolve outros riscos de esgotamento. Mesmo hoje já nos aproximamos do limite de muitos minérios fundamentais para tecnologias de uso intensivo, como computadores, celulares e outras. Nos países industrializados, o consumo médio anual por habitante nessa área dos minérios é de 16 toneladas (40 em alguns); em 2000, era de 8 a 10 toneladas; em 1900, de 4 a 5.

Na área dos alimentos, o problema não é diferente. Diz a ONU (AP, 27/10/10) que também a biodiversidade em matéria de alimentos está ameaçada. Em 100 anos, 75% das espécies de plantas alimentares já desapareceram; até 2050, mais 22% podem ter o mesmo destino, inclusive variedades de batata, feijão e nozes - e neste caso o clima é uma das questões centrais. Por isso mesmo, a Embrapa tenta produzir variedades de culturas resistentes ao calor, como soja, feijão e milho, pois as variedades atuais já estão sendo afetadas pelo aumento da temperatura, especialmente no Centro-Oeste. E convém não esquecer que o café, que dominou a economia agrícola de São Paulo e Norte do Paraná durante mais de um século, teve de migrar para regiões mais altas, principalmente em Minas Gerais, por causa do aumento de mais de um grau na temperatura (que leva a flor do cafeeiro a cair prematuramente, com redução da produtividade).

É em meio a esse panorama que chegam as notícias de que mais uma vez o desmatamento na Amazônia voltou a crescer, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - mais 28% no mês de julho, comparado com o mesmo período do ano passado, e mais 35% comparando 11 meses de 2010/11 com igual período anterior. Certamente o total de um ano ficará acima de 7 mil quilômetros quadrados, embora o governo federal tenha até criado uma força especial para conter o abate de árvores. É grave, até mesmo porque a floresta absorve um terço das emissões de dióxido de carbono, cerca de 2,4 bilhões de toneladas anuais ( Science/France Presse , 17/7/11). E seu papel é decisivo no Brasil, onde mudanças no uso do solo, desmatamentos e queimadas respondem por quase 60% do total das emissões brasileiras que afetam o clima.

Mas fora do Brasil os sinais também não são animadores. Já se sabe que a próxima reunião da Convenção do Clima, na África do Sul, No fim do ano, não levará a nenhum acordo global. Da mesma forma que o Protocolo de Kyoto, que expira em 2012 e permite a países industrializados e suas empresas financiar projetos que levem a reduções de emissões em outros países e contabilizar as reduções em seus balanços. As lógicas financeiras continuam a prevalecer, agora ainda mais, no meio da gigantesca crise financeira mundial.

Mas o futuro está em jogo. Não há como escapar às graves questões planetárias que assustam a ciência.


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