Todas as noites tenho sonhado com minha mãe. Estou na casa dela, e peço que ela fique uns dias comigo. Ela está tão viva e me diz que sim, irá ficar. E decerto ficará. Mas quando acordo, um desespero me atinge, ao lembrar que vivi em outra realidade, e nesta, ela está morta.
No portão da casa às vezes aparece meu amado de tantas eras. O rosto como de um cadáver, o aspecto de um morto, as mãos brancas e um silêncio que eu entendo. O coração batendo forte. Meus cabelos estão compridos, exatamente como estão agora, porém, nesta realidade, não há nada naquele portão, e o coração que pulsa é somente meu.
Esta casa que aparece em meus sonhos apenas me atormenta, é um lugar onde minha alma às vezes se aprisiona, de onde não consigo sair devido à saudade, à dor, à lembrança. Quero muito vê-la, quero desesperadamente sentí-la perto de mim, sei que isto não me é permitido, mas eu imploro à morte por favor, deixe-me ver minha mãe.
Mas eu tenho meu lar e meu templo. E hoje vou contar como ele é.
Moro em uma casa com janelas muito grandes. Minha vista é para onde nasce a lua. Bem em frente está um cemitério e suas árvores, todas aparentemente imóveis e silentes. Vejo essa paisagem todos os dias, foi por isso que escolhi morar aqui.
No outro oposto da casa é onde o Sol termina. A janela da minha sala recebe todos os dias as cores vermelhas, rosas e roxas do por do sol. E nas madrugadas é por ali que acompanho a trajetória da lua...
Aqui tem uma energia bonita, a minha paz e a paz da casa. As duas juntas formam um lugar onde eu adoro ficar.
A calma da casa é complementar ao ruído da rua. A combinação destas duas estão em perfeita ordem em minha vida. Eu adoro esta rua, eu idolatro minha casa. É uma rua simples, é uma casa antiga. As duas tem aspectos de mim mesma, por isso as amo.
A cozinha é unida à àrea de serviço. Arranquei a porta que as separava. Quero espaço! Tem ali outra janela, para o mesmo sol que eu sinto no entardecer.
O banheiro é ao lado do quarto, é grande e claro. E está cheio de livros, minha amiga me diz: esta casa está ficando a tua cara.
Há livros também na cozinha, na sala e principalmente no quarto, onde está provisoriamente minha biblioteca maior.
Na minha sala existe um painel na parede. É a ilustração de um parque com muitas árvores e um lago. Sempre quis ter esse tipo de painel na minha sala e, por 'coincidências' da vida, aí ele está.
Aqui passo os meus dias, mais precisamente os finais de tarde, as noites e também alguns fins de semanas...
Procuro não misturar a tristeza que se aproxima de mim em certos dias, ao aconchego de minha casa. Ao entrar aqui, procuro deixar lá fora minhas lástimas, porém nem sempre é possível, ao adormercer meus sonhos me despertam, e acordo todos os dias às três da manhã, com a memória forte de um desses sonhos... Eis a nova fase de minha vida, estranha e feliz. Estou simplesmente sendo eu, por fim!