sábado, 27 de novembro de 2010

Segundo bióloga, é ingenuidade reviver animais que os seres humanos extinguiram



O lobo da Tasmânia foi extinto da ilha australiana nos anos 30, mas pesquisadores planejam cloná-lo para reintroduzir o animal na natureza (Foto: AFP)

A reintrodução de espécies extintas (ou praticamente extintas) em determinadas regiões foi comum ano de 2010. Foi o caso do castor, desaparecido da Grã-Bretanha por 400 anos e visto novamente após reintrodução em uma floresta da Escócia. Também o lince ibérico (quase extinto em Portugal e na Espanha, país que tenta reintroduzir animais criados em cativeiro), o crocodilo siamês (Vietnã) e as chitas, que estavam desaparecidas na Índia, ganharam projetos similares. No caso da última espécie, o esquema de reintrodução sofreu críticas de especialistas que afirmam que, sem reintroduzir também as presas naturais das chitas, que foram erradicadas da Índia assim como o felino, a espécie não irá se proliferar no local.

Na opinião da bióloga e colunista da ANDA Ellen Augusta Valer de Freitas, processos de reintrodução envolvem “variáveis imprevisíveis”. “É pretensão ou ingenuidade humana querer trazer de volta espécies extintas naturalmente ou que ele mesmo ajudou a extinguir, sem um estudo das consequências dessa reintrodução”, diz Ellen, que aponta algumas particularidades a serem observadas. “Animais extintos da natureza e que hoje só existem em zoológicos e centros de proteção podem ser reintroduzidos. Mas com os ambientes desequilibrados a tarefa se torna difícil. A reintrodução deve levar em consideração as condições ecológicas de um ambiente e as interações desta espécie com as espécies atuais”, explicou.

Ela esclarece que, quando uma espécie ou subespécie extinta há séculos, ou até milênios, é reintroduzida, o ecossistema pode sofrer. “A variabilidade genética deve ser levada em conta. Animais são extintos justamente por problemas genéticos causados pela redução significativa de sua espécie, ou por problemas ambientais locais, globais ou de acordo com a época em que viveu o animal em questão”, disse. Ellen cita o panda da China como exemplo. “Embora exista em zoológicos, ele tem imensas dificuldades de reprodução e pequena variabilidade genética, o que causa doenças, dificuldades de reprodução e consequentemente a extinção. Pode-se dizer que animais como este, na prática, já estão extintos”.

Associada à limitação genética também está a mudança dos ecossistemas, que coloca um grande ponto de interrogação nas formas de preservação, teoricamente beneficiadas por avanços da ciência, como a clonagem. “Se a clonagem pode trazer à vida um animal como o lobo da Tasmânia, a pergunta é se isso é benéfico para o animal em si e para o ecossistema em que ele viverá. Animais extintos há muito tempo viveram em ambientes distintos do atual. Eles tiveram interações com outros seres, alimentando-se de outros animais, plantas, etc., que hoje podem não existir mais”, alerta a bióloga.

Ellen também lembra que a clonagem não prevê a variabilidade genética, tida como o combustível da evolução e da adaptação. “Existem clones naturais, mas toda introdução feita através do ser humano pode sim causar desequilíbrio no ecossistema que possui auto-organização. Clones podem existir, mas isso implica em responsabilidades éticas”.

Para Freitas, o Brasil tem a tendência de reintroduzir animais mais “carismáticos” como aves e mamíferos. “As espécies que podem ser alvo desse trabalho são peixes, plantas, anfíbios e outras menos conhecidas da população, mas com importância ecológica. No Rio Grande do Sul o número de anfíbios em processo de extinção é alarmante. Há muitos trabalhos publicados, mas poucos projetos efetivos”.

Histórias de sucesso

Mesmo assim, histórias bem sucedidas de reintrodução existem. Através de projetos de preservação, animais como a ararinha azul (Cyanopsitta spixii) e o gavião real (Harpia harpyja), praticamente extintos no Rio Grande do Sul, ainda podem ser encontrados na Amazônia.

Outro exemplo de inciativa de sucesso é a do Instituto Baleia Jubarte (Megaptera novaeangliae), também chamada baleia corcunda ou preta. Conhecida por seu temperamento dócil e acrobacias, a espécie só saiu da lista de animais ameaçados em 2008, e atualmente conta com 50 mil exemplares vivendo nos oceanos. No Atlântico Sul Ocidental, a sua principal área de reprodução é o Banco dos Abrolhos, no litoral sul da Bahia. De julho a novembro, estas baleias procuram as águas quentes para acasalar e dar à luz a um único filhote, que nasce após aproximadamente 11 meses de gestação.

Quem permanece na lista é a Baleia franca (Balaena mysticetus), segunda espécie de baleia mais ameaçada de extinção no planeta. Enfrentando dificuldades como a sobrepesca, a caça e a falta de educação ambiental, especialistas criaram uma Unidade de Conservação em Imbituba, no litoral de Santa Catarina. O Projeto Baleia Franca visa a conservação da espécie por meio de atividades de educação ambiental e observação dos animais quando eles se aproximam do litoral, nos meses de inverno.

Já o peixe-boi é o mamífero aquático mais ameaçado de extinção no País. Duas variações são encontradas no Brasil: o Peixe-boi-marinho (Trichechus manatus) e o Peixe-boi-da-amazônia (Trichechus inunguis). No passado, podiam ser vistos em toda a costa, do Espírito Santo ao Amapá. Hoje, aparecem apenas no Amapá, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas, tendo desaparecido no Espírito Santo, Bahia e Sergipe.

Em setembro de 2007, pesquisadores de Manaus organizaram a primeira reintrodução de peixe-boi amazônico em água doce. Zelando pela conservação do peixe-boi marinho está o Centro de Mamíferos Aquáticos em Itamaracá, na região metropolitana do Recife. Conhecido pelo seu trabalho de conservação, a instituição comemora 30 anos de atividades e, juntamente com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), reintroduziu 4 peixes-boi à natureza no ano de 2010.

Fonte: Terra e ANDA - Agência de notícias de direitos animais
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